24 novembro 2011



   Um homem com gripe

Pachos na testa, terço na mão,
Uma botija, chá de limão,
Zaragatoas, vinho com mel,
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher.
Ai Lurdes que vou morrer.
Mede-me a febre, olha-me a goela,
Cala os miúdos, fecha a janela,
Não quero canja, nem a salada,
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada.
Se tu sonhasses como me sinto,
Já vejo a morte nunca te minto,
Já vejo o inferno, chamas, diabos,
anjos estranhos, cornos e rabos,
Vejo demónios nas suas danças
Tigres sem listras, bodes sem tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes fica comigo
Não é o pingo de uma torneira,
Põe-me a Santinha à cabeceira,
Compõe-me a colcha,
Fala ao prior,
Pousa o Jesus no cobertor.
Chama o Doutor, passa a chamada,
Ai Lurdes, Lurdes nem dás por nada.
Faz-me tisana e pão-de-ló,
Não te levantes que fico só,
Aqui sozinho a apodrecer,
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer.

António Lobo Antunes

21 novembro 2011

Rio Sado

Reserva Natural do Estuário do Sado

A Reserva Natural do Estuário do Sado é constituída por uma sucessão de água de rio e de água de mar, bancos de areia e de vasa, praias, dunas e sapais.
Esta constitui um ecossistema rico e produtivo ao qual se encontram associadas uma flora e fauna diversas.
O rio Sado nasce na serra da Vigia, a sueste de Ourique, e percorre 180 km de margens mais ou menos planas, desembocando no oceano, entre o Outão e a ponta de Troia.
Golfo profundo, o estuário do Sado corresponde atualmente à vasta superfície de águas que vai da foz do rio até sensivelmente Alcácer do Sal, onde a influência das marés perde a sua força. As águas do rio, salvo em épocas de cheia acentuada, pouco influenciam a circulação geral do estuário.
O relevo que circunda o estuário é de muito pequena altitude. Os pontos mais altos sobem acima dos 30 m de altura - o outeiro Alto, na margem direita, atinge os 36 metros, enquanto que na Malha da Costa, 24 metros, é o ponto mais elevado da margem sul -, a contrastar de forma evidente com a Arrábida que está próxima.
No que diz respeito à flora aquícola, esta pode ser encontrada no parcel ou morraçal - depósito de lodos onde cresce uma vegetação típica dominada pela morraça, que lhe dá o nome, e banhada pelas marés mais altas - e no sapal - terrenos salgados de aluvião cobertos por uma vegetação rasteira.
Há ainda a referir as superfícies lodosas sem vegetação, onde se implantaram os bancos de bivalves, nomeadamente berbigão e navalha, e onde também é praticada a colheita de poliquetas.
Comporta, Carrasqueira, Monte Novo de Palma, Foicinhas, Herdade do Pinheiro e Monte das Cabras constituem as maiores manchas de sapal do estuário do Sado, áreas naturais ocupadas por gramíneas e arbustos halofíticos de pequeno porte, situados ao longo de massas de água salgada cujo nível varia de acordo com as marés. A morraça domina nas zonas onde o grau de salinidade é maior.
As plantas que se desenvolvem nas dunas constituem um outro elemento de grande importância. Na realidade, a península de Troia, uma das principais estruturas dunares do litoral, alberga, a par de largas dezenas de espécies vegetais mais vulgares, alguns endemismos portugueses, ibéricos e europeus. Assim, desde a zona da praia, na pré-duna, até ao flanco continental da duna primária sucedem-se as espécies adaptadas às areias marítimas como é o caso do estorno, do cordeiro-da-praia e do feno-das-praias entre outras. Mais para o interior, encontram-se os montados - o sobreiro e as associações onde domina esta árvore representam o habitat dominante na zona terrestre da Reserva Natural.
Nas linhas de água existentes em redor do estuário surgem as matas ribeirinhas, em que se pode observar espécies como o amieiro, o freixo, o ulmeiro e o salgueiro, enquanto o junco e a tamargueira surgem nas zonas onde ocorre água salobra. Finalmente, são ainda observáveis no estuário do Sado um ou outro caniçal, sobretudo na orla das linhas de água e lagoas, se bem que os caniçais estejam em regressão, devido sobretudo à expansão da orizicultura.
O estuário alberga uma grande variedade de peixes, moluscos e crustáceos. Assim, na fauna ictiológica podem-se referir o salmonete, o linguado, a tainha, a solha, a dourada, o charroco, entre aproximadamente 70 espécies presentes e que estão na origem da atividade dos portos piscatórios da Gâmbia e da Carrasqueira. Há ainda cefalópodes, como o polvo, o choco e a lula, crustáceos, como o caranguejo e a camarinha, bem com diferentes amêijoas. De entre todas as espécies animais presentes no Sado o ruaz-corvineiro é, sem dúvida, aquela que mais atrai as atenções. Estes animais constituem uma colónia de aproximadamente 40 indivíduos, que percorrem as águas marinhas entre o Tejo e o Sado e que, neste último estuário, possuem o seu principal local de alimentação.
No que diz respeito à avifauna, são dois os locais que mais particularmente atraem a atenção: a ilha do Cavalo e o açude da Murta. A primeira é uma área relativamente vasta de lezíria e cultura arvense, com numerosos charcos e pequenas manchas de vegetação palustre, onde nidificam, entre outras espécies, o perna-longa, a perdiz-do-mar e a alvéola-amarela, sendo refúgio para várias outras espécies de limícolas e anatídeos. O açude da Murta, se bem que se trate de uma área adjacente ao estuário, é charco natural de água doce rodeado por uma charneca de matos espinhosos e pinhal, cuja localização permite às espécies que nela nidificam um intercâmbio com as margens lodosas do estuário onde procuram alimento. O açude, para além de albergar uma grande colónia de garças - garça-branca, garça-boieira, garça-vermelha e goraz -, é também ponto de refúgio para alguns anatídeos como o pato-real e o marrequinho. Também várias espécies de passeriformes - felosa-real, rouxinol-pequeno-dos-caniços ou bico-de-lacre - habitam nos caniçais, enquanto as aves de presa encontram habitat favorável na zona da Herdade do Pinheiro, que apresenta um substrato ecológico diversificado.
Gineta, saca-rabo e lontra são alguns dos mamíferos presentes na periferia do estuário, não se podendo deixar de referir a população de gamos nos terrenos da Herdade do Pinheiro.
As salinas do Sado ainda hoje ocupam uma extensa área ao longo das margens do estuário, entre a Mitrena e o Pontal, na margem norte, e entre a Rapa e Montevil, na margem sul.
O sal de Setúbal sempre teve fama de ser dos melhores, devido fundamentalmente à ausência de sais magnesianos. O sal necessitou sempre de ser transportado para o exterior dos salgados que o produziam e uma das formas mais fáceis de o fazer foi, desde sempre, a utilização da via fluvial. A última embarcação concebida no estuário do Sado para desempenhar tal papel foi o "galeão do sal", hoje desaparecido, adaptação de uma outra embarcação que o precedeu, o "galeão de carga".
Por fim o moinho de Maré das Mouriscas representa um último testemunho de uma época em que a importância das energias renováveis, neste caso a energia das marés, era por de mais evidente.


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15 novembro 2011


       Ser feliz
Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes,
mas não esqueço de que a minha vida é a maior empresa do mundo.
E que posso evitar que ela vá a falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e
se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar
um oásis no recôndito da sua alma .
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um 'não'.
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo...

(Fernando Pessoa)

11 novembro 2011

O Genoma Humano

DNA
Célula

 O Genoma Humano:

A abertura do livro da vida

A publicação das duas primeiras análises da seqüência do genoma humano contém revelações inesperadas, mas se trata apenas do começo das tentativas de decifrar este manual de instruções do homem. Em um assunto tão importante, que passou do silêncio dos laboratórios ao primeiro plano da atenção pública, o leigo precisa entender um pouco do vocabulário para saber do que está falando.
 
O que é um genoma?

É a soma de genes que define como se desenvolve e como funciona um ser vivo. É seu manual de instruções. O genoma é transmitido, com variações individuais, de geração em geração e determina a espécie do ser vivo. Neste programa genético se encontram gravadas nossas características hereditárias encarregadas de dirigir o desenvolvimento biológico de cada indivíduo.
As doenças hereditárias também estão escritas no genoma. Todos os seres vivos, desde os maiores, como o elefante e a baleia, até os minúsculos, como as bactérias, além de plantas, árvores e, claro, o ser humano, têm genoma. A metade do genoma que se herda provêm do macho e a outra metade, da fêmea. Assim se reconstrói a árvore genealógica de todo ser vivo e a herança recebida de seus antepassados aparece no genoma de cada ser. O genoma está escrito na linguagem química do ácido desoxiribonucleico (DNA).
Onde se encontra o genoma?
Cada ser vivo é composto de célula. Cada célula, que é como uma esfera de 0,01 mm de diâmetro, contém em seu núcleo duas metades, a materna e a paterna, do genoma do indivíduo. No ser humano se encontram 23 pares de cromossomos, cada um composto de uma molécula comprida, enrolada em forma de hélice dupla.
Como surge um novo genoma?
Um novo genoma se origina pela fecundação, durante a reprodução. As células sexuais, diferentemente de todas as outras, têm apenas metade do genoma do indivíduo. Essa metade não é nem masculina nem feminina, mas uma combinação delas. Para isso, os órgãos reprodutores do organismo adulto combinam aleatoriamente partes do genoma de sua metade masculina com partes de sua metade feminina, em um processo diferente das outras células do corpo, gerando assim células sexuais.

No ser humano, as combinações possíveis são da ordem de 3 bilhões elevados ao quadrado. A probabilidade de repetir uma combinação é praticamente nula. Cada célula sexual de um mesmo indivíduo leva uma seqüência única, que nunca se formou antes e, depois, jamais voltará a forma-se.
Como se desenvolve o novo genoma?
O novo genoma é totalmente autosuficiente em seu desenvolvimento, e só precisa se alimentar. Imediatamente depois da fecundação, começa o desenvolvimento celular dirigido pelo genoma. A primeira célula já contém todo o material genético capaz de formar o novo ser. A partir daí, surge, em poucas horas, uma cópia completa de seu genoma e se formam duas células, cada uma com essa cópia. O processo se repete sucessivamente, passando de 4 para 8 células e assim por diante até cerca de cem células, todas iguais.

Estas células ainda não se diferenciaram, ou seja, ainda não têm uma função específica. Ainda que todas as células de um indivíduo tenham o mesmo genoma, uma vez que o programa tenha definido e que cada célula fará no organismo adulto, não há mais caminho de volta - embora pesquisas recentes para clonar tecidos adultos tenha conseguido uma reprodução limitada de células já diferenciadas.


Por isso, no DNA, alguns genes se manifestam e outros se calam para sempre. O que se conhece é apenas por que mecanismos isso ocorre. A partir deste ponto, cada célula começa um caminho distinto segundo o desenvolvimento diferenciado do programa genético. Algumas delas darão origem à pele, outras ao intestino e outras ao cérebro, por exemplo.
Como é o desenvolvimento do ser humano?
No ser humano, um mês depois da fecundação, é possível comprovar como bate o coração e circula o sangue, a formação dos olhos, a medula espinhal, os pulmões, o estômago e os intestinos. Neste momento, a mãe começa a suspeitar da gravidez por causa da ausência de menstruação. Com 40 dias de vida, já é possível até fazer um eletrocardiograma no embrião. Pouco depois, um eletroencefalograma detectará atividade elétrica no seu cérebro.

Dez dias depois, já são perceptíveis as impressões digitais, que ficarão gravadas para sempre e diferenciarão este indivíduo de milhões de seus semelhantes. São claramente visíveis os olhos, orelhas e o nariz. Os lábios se abrem e fecham. Com dois meses de gestação, todos os sistemas do corpo estão funcionando, e o feto mede 4 cm e pesa 4 gramas. A partir daí, ele apenas aumenta de tamanho até cerca de 22 anos de idade.
Cada genoma é único?
Das centenas de espermatozóides que tentam entrar no óvulo, o primeiro que consegue atravessar a membrana provoca uma mudança que a reforça e evita que outro espermatozóide consiga fazer o mesmo. Desta maneira, o organismo assegura que o novo genoma tem sua origem na fusão de apenas uma cópia materna e uma cópia paterna.
Os gêmeos têm o mesmo genoma?
A regra da irrepetibilidade do ser vivo em relação aos seus semelhantes tem uma exceção na natureza: os gêmeos. Ele se originam de apenas um genoma, quando as células se dividiram e têm a capacidade de gerar um ser vivo completo. São clones naturais.
Sua separação pode ocorrer por uma pressão mecânica, por exemplo, e assim surgem dois seres com o mesmo genoma. Este fato natural, bem conhecido, pode ser reproduzido em laboratório com o objetivo de gerar cópias idênticas de um ser: réplicas clonadas.
Tão parecidos e tão diferentes
· 99.8% dos dados genéticos são comuns a todas as pessoas. Para a genética, não faz sentido falar em raças. Mas esse 02% supõe cerca de 6 milhões de diferenças, cujas combinações são matematicamente suficientes para moldar seres muitos diferentes.

· A estrutura genética de cada indivíduo é única e peculiar, exceto nos gêmeos e nos que não apresentam diferenças em seu genoma. Porém, não deixam de ser duas pessoas diferentes.
97% do genoma humano não exerce nenhuma função aparentemente conhecida. Há uma grande quantidade de informações no genoma que não serão genes. Supõe-se que essa grande maioria de informações sirva de elemento de controle para a expressão dos genes onde e quando necessitem.


Fonte: INTERPRENSA





01 novembro 2011

 

 

A morte

A morte não é nada.
Tenho apenas escapuliu para a próxima sala.
Eu sou eu e você é você.
O que estávamos juntos,
Que ainda o fazem.

Chame-me pelo meu antigo nome familiar.
Falar-me o caminho mais fácil
você sempre usa.
Não fez diferença em seu tom.
Não use ar forçado de solenidade ou sofrimento.

Sorriso como sempre riu
com as piadas que desfrutamos juntos.
Play, sorriso, pense em mim. Ore por mim.
Sempre deixar o meu nome uma palavra de casa
ele sempre foi.
Deixe-o falar sem efeito.
Nenhum traço de uma sombra sobre ele.

Vida significa tudo o que sempre quis dizer.
É o mesmo que sempre foi.
Não há continuidade ininterrupta absoluta.
Por que eu deveria estar fora da mente
porque eu estou fora da vista?

Eu estou pronto para você.
Para uma pausa.
Em algum lugar. Muito perto.
Ao virar da esquina.

Tudo é bom.
Henry Scott Holland

26 outubro 2011




OS NINGUÉS

As pulgas sonham em comprar um cão, e os ninguéns com deixar a pobreza, que em algum dia mágico de sorte chova a boa sorte a cântaros; mas a boa sorte não chova ontem, nem hoje, nem amanhã, nem nunca, nem uma chuvinha cai do céu da boa sorte, por mais que os ninguéns a chamem e mesmo que a mão esquerda coce, ou se levantem com o pé direito, ou comecem o ano mudando de vassoura.
Os ninguéns: os filhos de ninguém, os dono de nada.
Os ninguéns: os nenhuns, correndo soltos, morrendo a vida, fodidos e mal pagos:
Que não são embora sejam.
Que não falam idiomas, falam dialetos.
Que não praticam religiões, praticam superstições.
Que não fazem arte, fazem artesanato.
Que não são seres humanos, são recursos humanos.
Que não tem cultura, têm folclore.
Que não têm cara, têm braços.
Que não têm nome, têm número.
Que não aparecem na história universal, aparecem nas páginas policiais da imprensa local.
Os ninguéns, que custam menos do que a bala que os mata.”
(Os Ninguéns, Eduardo Galeano.)

25 outubro 2011


Poema lindíssimo de Fernando Pessoa    
Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes,
mas não esqueço de que a minha vida é a maior empresa do mundo.
E que posso evitar que ela vá a falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e
se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar
um oásis no recôndito da sua alma .
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um 'não'.
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo...
(Fernando Pessoa)

08 outubro 2011