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Amar!
Eu quero amar, amar perdidamente !
Amar só por amar:Aqui ...além
NATALAcontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.
Era gente a correr pela música acima.
Uma onda uma festa. Palavras a saltar.Eram carpas ou mãos. Um soluço uma rima.
Guitarras guitarras. Ou talvez mar.
E acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.Na tua boca. No teu rosto. No teu corpo acontecia.
No teu ritmo nos teus ritos.
No teu sono nos teus gestos. (Liturgia liturgia).
Nos teus gritos. Nos teus olhos quase aflitos.
E nos silêncios infinitos. Na tua noite e no teu dia.
No teu sol acontecia.Era um sopro. Era um salmo. (Nostalgia nostalgia).
Todo o tempo num só tempo: andamento
de poesia. Era um susto. Ou sobressalto. E acontecia.
Na cidade lavada pela chuva. Em cada curva
acontecia. E em cada acaso. Como um pouco de água turva
na cidade agitada pelo vento.Natal Natal (diziam). E acontecia.
Como se fosse na palavra a rosa brava
acontecia. E era Dezembro que floria.
Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.
Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia.Manuel Alegre
PABLO NERUDA ODE À CEBOLA Cebola, luminosa redoma, pétala a pétala formou-se a tua formosura, escamas de cristal te acrescentaram e no segredo da terra sombria arredondou-se o teu ventre de orvalho. Sob a terra deu-se o milagre e quando apareceu teu rude caule verde, e nasceram as tuas folhas como espadas no horto a terra acumulou seu poderio mostrando a tua nua transparência, e como em Afrodite o mar distante duplicou a magnólia levantando-lhe os seios, a terra fez-te assim, cebola, clara como um planeta, e destinada a reluzir, constelação constante, redonda rosa de água, sobre a mesa dos pobres. Generosa desfazes teu globo de frescura na consumação fervente do cozido, e o girão de cristal ao calor inflamado do azeite transforma-se em ondulada pluma de ouro. Recordarei também como a tua influência fecunda o amor da salada e parece que contribui o céu dando-te a fina forma do granizo a celebrar a tua luz picada sobre os hemisférios de um tomate. Mas ao alcance das mãos do povo, regada com azeite, polvilhada com um pouco de sal, matas a fome do jornaleiro no duro caminho. Estrela dos pobres, fada madrinha envolta em delicado papel, tu sais do solo, eterna, intacta, pura como semente de astros, e ao cortar-te a faca de cozinha sobe a única lágrima sem mágoa. Fizeste-nos chorar mas sem sofrer. Tudo o que existe celebrei, cebola, mas para mim és mais formosa que um pássaro de plumas ofuscantes, és para os meus olhos globo celeste, taça de platina, baile imóvel de anémona nevada e a fragância da terra inteira vive na tua natureza cristalina. (tradução de José Bento, in Antologia de Pablo Neruda, editorial Inova, 1973 - As mãos e os frutos) |